Quando conhecemos verdadeiramente
um local não precisamos ver para saber onde está cada coisa, onde fica a mesa e
suas cadeiras, a televisão, a geladeira, o sofá, o guarda-roupa, a pia. Se por
um instante qualquer fecharmos nossos olhos e apalparmos objetos, o veremos de
forma diferente mas o sentiremos ali. Com um toque podemos enxergar uma infinidade
de coisas que talvez nem prestemos atenção no decorrer do dia, é como uma ponte
que possibilita-nos experimentar uma nova sensação.
Imagine um homem que
acidentalmente perdeu a visão quando criança e desde então teve que se adaptar
a um novo estilo de vida e assim viveu muitos anos. Ele não tem noção de
profundidade, perspectiva e tão pouco noção espacial, mas ele consegue
atravessar a rua, ouvir o barulho da chuva, saber onde tem uma goteira no teto
só pelo barulho diferente que faz, ele sabe onde ficam as cadeiras da mesa de
jantar e onde seu cachorro vai está quando chegar da rua. Já imaginou um cego
andando de patins? Não é hilário. É surpreendente, andar de patins no gelo e
ainda conduzir sua dama nessa dança.
Se esse mesmo cego voltar a
enxergar um dia, ele era acostumado a pegar um maça e pelo formato, cheiro e
gosto sabia que era uma maça, ele passou a enxergar e mostramos á ele uma
fotografia de uma maça, ela vai querer pegar igual ele pega uma maça de
verdade, isso porque ele não tem noção de profundidade, para ele uma maça é uma
maça, não precisar ter mais, é simples. Quem vai explicar para um cego que
existe fotografia e imagens lançadas em revistas, jornais, cartazes e que essas
imagens são recriações de coisas já existentes e que ele não pode pegar nessas
imagens como ele pega uma maça por exemplo.
Como explicar também a questão das
cores? Se você come arroz, feijão, carne e salada a sua vida toda e só consegue
saber qual é qual se ingerir e decifrar pelo gosto, então um dia voltou a
enxergar e viu que tudo o que comia antes, tinha uma cor e assim acontece o
mesmo com bebidas, você toma sua de laranja, de morango, de uva, de limão, bebe
água, toma Coca-cola e um belo dia colocam vários recipientes com líquidos e
pedem para descobrir qual é qual pela cor. Um cego não conseguirá desenvolver a
atividade, pois ele não conhece as cores, ele não sabe que suco de laranja é
laranjado ou amarelo, que suco de limão é verde e que a Coca-cola é preta.
Como passar na rua e ver o carro
se aproximando mas não saber que se ele se aproximar demais você é atropelado.
Antes um cego sabia se podia atravessar ou não pelo som que emitia dos carros e
hoje enxergando, ele tem outro recurso chamado Olhos mas que para ele não tem
tanta serventia.
Sinceramente acha que para uma
pessoa voltar a enxergar é fácil? Todos pensam na parte boa de ter visão,
embora não se preocupem se ele se sentirá deslocado ou não, se ele realmente
não gostava daquela vida “organizada” que tinha.
Enxergar não é algo fácil, não é
simplesmente olhar e pronto. Presenciamos tantas imagens nas ruas que para nós
se tornaram comum demais para chamar nossa atenção, temos noção de profundidade
mas talvez não a usemos muito, tantas imagens vêem até nós e simplesmente
rejeitamos.
Devemos aprender a deixar as
imagens, formas e cores nos embalar e surpreender a vida. Um fotografo não sai
por ai tirando fotos a torto e a direita só para completar figurinhas num
álbum, tem toda uma visão de ângulo, de espaço e de perspectiva por detrás de
cada olhar seja ele crítico ou não.
Não é simplesmente sair por
ai fazendo e fazendo sem prestar atenção naquilo que se faz. É necessário olhar
e enxergar todo o contexto histórico e linha traçada que faz acontecer.